NUTRIÇÃO “A regra dos 80/20 na alimentação ensina-nos que o equilíbrio é muito mais eficaz do que a perfeição” By Revista Spot | Abril 17, 2025 Abril 18, 2025 Share Tweet Share Pin Email Num mundo onde a perfeição é vendida como ideal, a regra do 80/20 na alimentação surge para nos lembrar que o verdadeiro superpoder é o equilíbrio. Alimentarmo-nos bem não é sinónimo de restrição total, mas de consciência, consistência e respeito pelo prazer de comer. Numa conversa sobre inflamação silenciosa, vício do açúcar, microbiota intestinal e mudança de hábitos, a nutricionista Ana Pedro ensina-nos que a nutrição clínica é a ponte entre ciência e cuidado individualizado, ajudando-nos a entender que o prato de cada pessoa conta uma história única. “O erro das dietas da moda está em ignorar essa individualidade, desconsiderando os sinais do corpo. No fim, a nutrição não é sobre contar calorias — é sobre viver melhor, com mais energia, clareza e conexão com quem realmente somos”, garante. O que é que levou a escolher a nutrição e a especializar-se em Nutrição Clínica? Sempre me fascinou a forma como os alimentos se transformam em saúde ou em doença. A nutrição clínica foi uma escolha natural por ser o ponto onde a ciência da nutrição se funde com o cuidado direto com o outro. Gosto de olhar para as escolhas alimentares de cada pessoa como um espelho do seu estado físico, emocional e até social. Para além disso, a ligação entre a ciência e o cuidado personalizado, tão presentes na nutrição clínica, sempre me atraiu. Tornar-me especialista pela Ordem dos Nutricionistas foi um passo natural, uma vez que acredito que cada pessoa merece uma abordagem baseada em evidência, mas também ajustada à sua realidade, ao seu diagnóstico e à sua história de vida. Desde 2007, o meu propósito tem sido esse: traduzir a ciência em estratégias práticas e humanizadas que realmente façam a diferença na vida de cada paciente. O conceito de “inflamação silenciosa” tem sido muito falado. Uma alimentação inadequada pode estar a acelerar o envelhecimento e a aumentar o risco de doenças crónicas? A inflamação silenciosa é como um fogo, em lume brando, que vai cozinhando o corpo por dentro, dia após dia. Isso muitas vezes começa no prato. Uma alimentação rica em açúcares refinados, gordura trans, alimentos ultraprocessados e pobre em fibras e antioxidantes alimenta esse processo inflamatório, que não dói, mas desgasta silenciosamente. O resultado? Envelhecimento precoce, doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, alterações hormonais, entre outros. Envelhecer é inevitável, mas a forma como envelhecemos, não é. Quais são os erros mais comuns que as pessoas cometem ao seguir “dietas da moda” sem orientação profissional? O maior erro é pensar que uma dieta que funcionou para alguém no Instagram vai funcionar igual para outra pessoa. Cada corpo tem a sua história, os seus ritmos, as suas necessidades. Quando se segue uma tendência sem saber o “porquê” e o “para quem”, os riscos vão desde carências nutricionais até desequilíbrios hormonais e transtornos alimentares. A nutrição não é uma moda, é uma ferramenta de saúde. E como qualquer ferramenta poderosa, precisa de ser usada com conhecimento. Seguir dietas da moda sem acompanhamento pode parecer uma solução rápida, mas esconde vários riscos. Um dos erros mais frequentes é copiar planos alimentares que se encontram na internet ou que foram partilhados por influencers, ignorando fatores como o metabolismo individual, o historial clínico ou os objetivos pessoais. Outro problema recorrente é a restrição calórica em excesso. Em dietas como o jejum intermitente, por exemplo, há quem acabe por consumir muito menos do que o necessário, o que pode prejudicar a função hormonal, provocar perda de massa muscular e afetar o estado emocional. Também é comum haver um desequilíbrio na ingestão de macronutrientes. Na dieta cetogénica, por exemplo, muitas pessoas exageram na ingestão de gorduras saturadas e deixam de lado a proteína ou a fibra. Já no veganismo, é frequente a exclusão de alimentos de origem animal sem o devido conhecimento sobre como substituir fontes importantes de ferro, vitamina B12, ómega-3 e proteína. Outro erro é ignorar os sinais que o corpo dá. Fadiga, irritabilidade, queda de cabelo ou alterações no sono podem indicar défices nutricionais, mas muitas vezes são desvalorizados ou atribuídos a outras causas. A rigidez na forma de comer também pode ser um problema. A procura pela “dieta perfeita” pode gerar uma relação obsessiva com a alimentação, levando à ansiedade e, em casos mais graves, a distúrbios alimentares. Além disso, muitos esquecem que certas abordagens exigem suplementação adequada. Dietas como o veganismo, a cetogénica ou o jejum prolongado, por exemplo, podem necessitar de suplementos específicos, e ignorá-los pode comprometer a saúde a médio e longo prazo. Por fim, há ainda a questão da sustentabilidade. Muitas destas dietas não são realistas a longo prazo. O entusiasmo inicial pode rapidamente transformar-se em frustração quando não há uma adaptação concreta ao estilo de vida da pessoa. No fundo, o problema não está na dieta em si, mas em como ela é aplicada. Sem ouvirmos o nosso corpo, sem educação nutricional e sem acompanhamento especializado, qualquer plano alimentar pode tornar-se uma armadilha disfarçada de solução. A alimentação influencia diretamente a nossa saúde mental? Completamente. O cérebro é um órgão bioquímico e o que comemos é matéria-prima para essa bioquímica. Uma dieta pobre em nutrientes pode interferir na produção de neurotransmissores, como a serotonina e a dopamina, fundamentais para o humor, o sono e o bem-estar. Diz-se que “o intestino é o segundo cérebro”. E é uma verdade porque 90% da serotonina é produzida lá. Por isso, comer bem é também uma forma de pensar e sentir melhor. A nossa saúde começa no intestino? Sim, e não é exagero dizer que o intestino é o epicentro da nossa saúde. Ele abriga trilhões de microrganismos que regulam o sistema imunitário, produzem vitaminas, ajudam na digestão e têm impacto direto na inflamação, na pele, no humor ou no peso. Um intestino em desequilíbrio — ou disbiose — pode ser a raiz de vários sintomas que parecem “desconectados”, como fadiga, ansiedade, inchaço ou enxaquecas. Cuidar do intestino é cuidar de tudo. Como adapta a nutrição clínica às diferentes fases da vida da mulher? Cada fase da vida da mulher traz um novo corpo, novos desafios e novas necessidades. A infância pede construção, a adolescência pede equilíbrio hormonal, a gravidez pede doação, o pós-parto pede recuperação e a menopausa pede proteção. A nutrição clínica entra como uma aliada, adaptando os nutrientes, as estratégias e até os horários das refeições, conforme cada etapa. Nutrir uma mulher é respeitar o seu ciclo, o seu tempo, a sua biologia e também as suas emoções. O conceito 80/20 – 80% alimentação saudável, 20% flexibilidade – pode ser uma estratégia eficaz para quem tem dificuldade em seguir planos restritivos? Sim, e mais do que eficaz, é realista e sustentável. O 80/20 é uma forma de mostrar que equilíbrio é mais poderoso do que perfeição. Comer bem na maior parte do tempo já traz benefícios significativos e permitir-se os 20% ajuda a manter uma relação saudável com a comida. Sem culpa, sem rigidez. Porque o que comemos todos os dias conta mais do que o que comemos de vez em quando. Portugal tem uma taxa de obesidade preocupante. Onde estamos a errar mais? Estamos a errar na base: educação alimentar. Ainda se confunde “comer muito” com “comer bem”. A obesidade não é apenas uma questão de excesso de comida, mas também de ausência de nutrientes, de rotinas desreguladas, de stress e de sedentarismo. Falta-nos tempo, informação e políticas públicas que facilitem escolhas saudáveis. Precisamos de ensinar mais sobre nutrição nas escolas, nas empresas, nos centros de saúde. E ouvir mais as pessoas porque cada corpo tem a sua história. Como podemos mudar essa mentalidade? Mudamos mostrando que emagrecer não é vencer o corpo, mas antes entender o corpo. A reeducação alimentar é o caminho que ensina a comer melhor e não apenas menos. É um processo de reconexão com os sinais de fome, saciedade e prazer. Quando a pessoa aprende a comer com consciência e consistência, o peso ajusta-se naturalmente. Precisamos de parar de tratar o peso como um número isolado e começar a olhar para a saúde como um todo. Hoje falamos muito em “viciados em açúcar”. O açúcar pode realmente ser tão viciante como algumas drogas? Sim. Em termos neuroquímicos, o açúcar ativa o sistema de recompensa do cérebro de forma muito semelhante a drogas, como a nicotina ou a cocaína. Ele gera prazer imediato, mas também tolerância, ou seja, precisamos de cada vez mais quantidade para se sentir o mesmo efeito. Além disso, está presente de forma “escondida” em muitos alimentos, o que torna difícil o controlo. Não é sobre demonizar o açúcar, mas sobre entender o seu impacto e aprender a consumi-lo com consciência. Se pudesse deixar apenas um conselho essencial sobre nutrição para a população em geral, qual seria? Coma com atenção e intenção. Saber o que se põe no prato é um ato de autocuidado, quase revolucionário, num mundo que vive em piloto automático. Não existe uma dieta perfeita, mas existe um padrão: comida de verdade, variedade, cores, fibras, hidratação e prazer. Comer bem é um investimento que começa na cozinha e que se reflete em cada célula do nosso corpo. Morada: Av. Carlos Bacelar n° 1041 2°, 4760-103 Vila Nova de Famalicão Contacto: 252 318 777 Facebook: ana_pedro_nutricionista | Sorrivida Instagram: @ana_pedro_nutricionista | @sorrivida_ WhatsApp: +351 912 672 678 “Se queremos que os nossos filhos partilhem o que sentem ou peçam desculpa quando erram, também devemos fazer o mesmo” Cem Anos®: A equipa que transforma a longevidade numa vida com propósito
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