“Foi numa infância passada entre o perfume a madeira das marcenarias que me apaixonei pela decoração”

Nasceu entre a magia da marcenaria portuguesa e a herança de uma família ligada ao mundo da decoração. Cátia Sá Alves, responsável pela Best Of Living, é empresária, decoradora, gestora de equipas, mas, sobretudo, uma apaixonada pela linguagem universal dos projetos que continuam a esbater fronteiras entre Portugal e o mundo.

Nascer no universo da decoração teve um impacto marcante no seu percurso profissional?

Dei os primeiros passos neste universo desde muito cedo, influenciada pelo meu pai, Américo Alves, fundador da emblemática Móveis Ben-Hur. Com uma linhagem que remonta à marcenaria do meu avô, cresci no ambiente dos móveis e da decoração, passando os meus tempos livres fora do horário escolar a explorar novas formas e texturas. Percebendo o meu interesse crescente, o meu pai começou a levar-me consigo nas férias, proporcionando-me uma educação prática ao envolver-me no universo das fábricas e feiras de decoração.

Que memórias guarda dessa época?

Desde tenra idade, nutria uma paixão pelo perfume da madeira das fábricas. Adorava observar o processo de fabrico e acompanhar os clientes. Sempre estive atenta ao processo de venda, mas sobretudo às pessoas. Aprendi desde cedo a lidar com os clientes e desenvolvi a importância da escuta ativa. Considero que essa foi a minha maior escola. Os meus três meses de férias eram passados neste ambiente envolvente.

Nessa época, a par dos Móveis Bem- Hur, existiam apenas mais duas ou três casas de referência. Recordo-me de existir em Braga uma grande feira de decoração realizada no antigo Parque de Exposições, onde as pessoas tinham contacto com as tendências e novidades mais recentes do setor. Era de tal forma um sucesso que às seis da manhã as pessoas já estavam à porta a formar fila. Na década de 80 estas feiras de decoração eram eventos de grande importância e toda a cidade comparecia. Recordo-me com saudade dessas semanas dedicadas ao atendimento dos clientes. Creio que foi todo este importante contexto que me inspirou a seguir, anos mais tarde, a minha formação nesta área.

A formação na área trouxe-lhe um input fundamental?

Após concluir o curso em 1997, o meu sentido estético apurado levou-me inicialmente para o mundo da moda. Contudo, o destino acabou por me trazer de volta à minha paixão assumida pela decoração. Assim, em 2003, com todos os meus sonhos e ambições reunidos num único projeto, lancei a Best Of Living. Posteriormente, o crescimento e a evolução dos projetos de arquitetura e decoração ditaram a criação de um atelier, que se tornou não só um ponto de encontro com os clientes, mas também o ponto de partida para todos os projetos.

Acredita que a sua perspetiva feminina faz a diferença num projeto?

Acredito firmemente que a minha perspetiva feminina faz toda a diferença na empatia e na sensibilidade em perceber as necessidades do cliente. As mulheres trazem uma sensibilidade única para o processo de design, que se reflete em vários aspetos do ambiente criado.

Uma das características distintivas é a atenção aos detalhes. As mulheres têm uma capacidade natural de perceber e valorizar pequenos detalhes que podem passar despercebidos. Além disso, tendemos a priorizar a funcionalidade e a praticidade no design de interiores, valorizando layouts intuitivos e eficientes, onde a forma segue a função.

E acredito, sobretudo, que as mulheres tendem a adotar uma abordagem colaborativa para o design de interiores. Procuramos, acima de tudo, o envolvimento dos clientes e outras partes interessadas no processo de design, garantindo que as suas necessidades e desejos sejam totalmente considerados.

Decorar tornou-se, para si, um ato quase natural?

Muito. O início de um projeto é verdadeiramente mágico. Cada escolha de elemento que irá compor o espaço, a curiosidade de acompanhar as diferentes etapas e o desejo de ver a obra concluída são experiências que me fascinam. O processo envolve a combinação de todos os elementos para criar um todo perfeito: tecidos, papéis de parede, móveis, iluminação, tapetes, arte e pequenos detalhes decorativos, privilegiando sempre a nobreza dos materiais.

O cliente é o centro do projeto. Ao olhar para ele, durante o primeiro briefing, consigo entender as suas necessidades e desejos. Ouvir atentamente o cliente é o primeiro passo para garantir o sucesso do projeto. Os melhores projetos são aqueles que conseguem criar uma empatia imediata com aqueles que os habitam. É um jogo delicado entre estética e equilíbrio, onde as formas de ser e de estar transformam um simples lugar numa experiência única.

Ao longo do tempo foi-se apaixonando também pela gestão de equipas?

A Best Of Living evoluiu para se especializar em projetos ‘chave-na-mão’, abrangendo uma vasta gama de serviços, como Arquitetura, Design de Interiores, Remodelação, Decoração, Design de Produto, entre outros. Contamos com uma equipa multidisciplinar que reúne arquitetos, designers de produto e uma equipa de obras altamente capacitada, capaz de enfrentar qualquer desafio.

A minha capacidade de lidar com diversas personalidades e profissionais já é inata à minha personalidade. Sou bastante adaptável, uma caraterística que fui cultivando ao longo dos anos. Trabalho de perto com toda a equipa, observar a transformação desde o ponto zero até ao resultado final é perceber que todos estes profissionais estão alinhados desde o primeiro dia.

O que é que tem acontecido no universo Best Of Living nos últimos meses?

O universo Best Of Living tem estado bastante ativo nos últimos meses, focando-se principalmente em projetos residenciais. Temos observado uma procura crescente tanto por clientes que desejam criar um projeto completamente novo, como por aqueles que pretendem remodelar ou revitalizar e atualizar os seus espaços. Muitas vezes, deparamo-nos com pessoas que se sentem descontentes com a sua casa e procuram uma mudança. Chegam até nós para que possamos fazer ajustes, que podem passar pela colocação de móveis mais adequados, ou pela introdução de elementos como papel de parede, que tragam uma nova roupagem aos ambientes. Uma pequena alteração pode fazer toda a diferença na energia de um espaço.

De simples remodelações de uma divisão a projetos integrais de remodelação, a Best Of Living tem a capacidade de enfrentar diferentes desafios, oferecendo soluções chave-na-mão e controlando todos os processos internamente.

Recentemente, temos tido projetos em Coimbra, Lisboa, Alentejo e Algarve. No entanto, não existem fronteiras geográficas. No nosso portfólio temos desde lofts no Porto até suites em Luanda, ou em qualquer parte do mundo.

Decorar vai muito além de escolher mobiliário e acessórios, é principalmente sobre provocar sensações e criar uma conexão emocional com o espaço. Seja na primeira casa de alguém, num palacete rodeado pela natureza, ou num Airbnb no coração da cidade, o objetivo é sempre criar um ambiente que seja verdadeiramente acolhedor e pessoal.

Ao fim de todos estes anos, o que é que ainda gostava de poder vir a fazer nesta área?

Não escondo a vontade de me aventurar numa área que me fascina: os hotéis de charme, empreendimentos mais intimistas e personalizados. Apesar de já ter realizado alguns projetos nessa área, ainda não tive a oportunidade de concretizar o hotel de charme que tanto desejo. Reconheço que este é um meio bastante competitivo, onde se enfrentam desafios diferentes.

Sinto-me atraída pela ideia de criar algo verdadeiramente especial e único, talvez até um restaurante de luxo, que represente um desafio diferente e estimulante. Apesar da diversidade de projetos que temos em mãos, não nego a minha vontade de explorar novos horizontes e de continuar a desafiar-me na área da decoração e do design de interiores.

A Best Of Living distingue-se também pela sua ligação aos artesãos. As pessoas estão a regressar a essa essência?

A relação com os artesãos é algo que apreciamos profundamente. Gostamos de visitar as fábricas e observar os artesãos a trabalhar, valorizando o processo artesanal e a dedicação envolvida em cada peça. Por vezes, deparamo-nos com a necessidade de procurar um restaurador especializado para uma peça única, o que, infelizmente, se tem tornado cada vez mais difícil de encontrar.

Esta ligação com os artesãos é o que realmente alimenta a nossa paixão. Gostamos que as pessoas nos procurem em busca de algo único e diferenciado para os seus projetos. É aí que reside o nosso verdadeiro entusiasmo e a nossa motivação: desenvolver peças e elementos que acrescentem uma essência singular e especial aos espaços que criamos.

Ao longo destes anos, que marcos retém na sua memória?

Ao longo destes anos, guarda na memória diversos marcos importantes. Destaco, por exemplo, uma intervenção de relevo no Ministério da Administração de Território em Luanda, juntamente com outras obras tanto em Portugal como no estrangeiro, muitas vezes destacadas em revistas especializadas na área. A experiência em Angola foi particularmente marcante e, agora, com o novo governo, estou novamente a ser contactada para novos projetos.

Durante a pandemia, também enfrentámos desafios significativos e tivemos que nos adaptar a novas formas de trabalho. Hoje em dia um decorador está intrinsecamente ligado à tecnologia e ao marketing digital, de forma a eliminar barreiras físicas.

Ser simultaneamente decoradora e empresária é um desafio constante, mas é a paixão pela alma dos projetos que me move. Há sempre algo novo para superar, uma nova história para contar.

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