“Doutora, eu tenho a tiróide!”

“Todos a temos, graças a Deus!” é o que pronta e animadamente respondo. Na realidade não são todos, mas quase todos. Raros são os casos em que se nasce sem tiróide (agenesia), com tiróide de reduzidas dimensões, noutras localizações ou simplesmente não funcionante, mas, já desde 1979 que, em Portugal, estes casos são precocemente detectados, à nascença, através do “teste do pezinho” que rastreia, entre outras doenças, o hipotiroidismo congénito.

Quem usa a expressão que dá título a este corpo de texto, vem habitualmente pelas doenças tiroideias mais frequentes, o hipotiroidismo, o hipertiroidismo, as tiroidites, os nódulos tiroideus e o bócio (tiróide de dimensões aumentadas). Em Portugal, cerca de 1 milhão de pessoas terão distúrbios tiroideus, grande parte ainda não diagnosticados.

Mas, para que serve a tiróide? A tiróide produz hormonas fundamentais ao crescimento, ao desenvolvimento cerebral, sexual, intelectual, emocional e ao normal metabolismo. Assim, o organismo é capaz de usar energia, manter-se aquecido e manter o cérebro, coração, músculos e outros órgãos a funcionar devidamente.

São vários os problemas que acometem a tiróide. Grosso modo, as doenças da tiróide podem dividir-se em doenças funcionais, relacionadas com alterações do seu funcionamento, e doenças estruturais, resultantes de alterações da sua normal morfologia. Dentro do primeiro grupo, o hipotiroidismo (falta de hormona tiroideia) é a causa mais frequente. Resulta comumente de uma afecção inflamatória autoimune da tiróide, a Tiroidite de Hashimoto. Outras causas comuns são o hipotiroidismo resultante da remoção parcial ou total da tiróide, bem como da terapêutica com iodo usada para tratar outras doenças tiroideias. O tratamento passa pela reposição da quantidade de hormona tiroideia em falta, muito dependente da causa e do peso do indivíduo. O hipertiroidismo (excesso de produção de hormona tiroideia) é também um distúrbio frequente. Em idades mais jovens, resulta habitualmente também de uma afecção inflamatória autoimune, a Doença de Graves. Nas pessoas mais idosas, é frequente resultar do ganho de autonomia de um ou mais nódulos tiroideus (nódulos tóxicos), deixando a tiróide, nestes casos, de estar subordinada à acção da glândula que a comanda, a hipófise. Em ambas as situações, a normalização da função tiroideia consegue-se com fármacos que inibem a síntese das hormonas produzidas pela tiróide. A Doença de Graves habitualmente responde favoravelmente ao tratamento. No entanto, quando não acontece, é necessário optar por soluções definitivas como a terapêutica ablativa com iodo 131 ou a cirurgia. Estas são também as soluções necessárias ao tratamento definitivo de nódulos autónomos.

Um alerta especial para quem deseja engravidar. A gravidez é uma condição fisiológica exigente para a tiróide. A tiróide normal cumpre o seu papel, mas uma tiróide doente pode não o conseguir, daqui podendo resultar, por exemplo, consequências fetais indesejáveis, como perturbações do desenvolvimento neurológico. Assim, recomenda-se que toda a mulher, com “problemas da tiróide” procure aconselhamento antes de engravidar. É importante igualmente o adequado acompanhamento na gravidez para o sucesso da mesma.

“Ter a tiróide” pode, portanto, querer dizer muita coisa! A tiróide é, de facto, um mundo e, por isso, havendo dúvidas, fale com o seu médico ou procure aconselhamento especializado.